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No campo da
pesquisa científica, os estudos sobre Esclerose Múltipla (EM) desenvolvem-se
sobretudo a partir de um olhar biomédico, em que se enfatiza a importância de
compreender fisiologicamente as causas, o percurso e os possíveis tratamentos
para a EM.
As pesquisas no campo biomédico apresentam historicamente o que é
chamado de visão positivista na ciência. Sob este olhar, entre outras coisas,
há a doença enquanto alvo a ser considerado, havendo um tratamento racional e
objetivo direcionado a essa doença, que provém sobretudo do conhecimento do
profissional.
Se há a
centralidade do olhar biomédico nos estudos sobre a EM, há em contrapartida a
necessidade de compreender a EM de maneira co-construtivista, ou seja, a partir
de um olhar em que se compreende o tratamento como construído ao longo do
contato entre paciente-profissional, a partir também (e principalmente, na
verdade) das próprias experiências dos pacientes, não centralizando a origem
dos conhecimentos no assunto ao profissional em si. Essa importância à pesquisa
construtivista e não verticalizada é uma forma de olhar a ciência; há quem
discordará. Contudo, crescem os olhares concordantes na literatura
científica.
Em 2009, foi
publicado um dos poucos estudos nas bases de dados científicos que é sobre a
vivência da EM compreendida a partir de relatos de pessoas diagnosticadas
(Fernandes, 2009). Os resultados de trabalhos assim ampliam o olhar do
profissional em saúde, subsidia condutas mais humanizadas e também mais
eficientes, justamente por considerar a vivência prática da doença. Ademais,
podem ser uma fonte do sentimento de autocompreensão para pacientes. No estudo
de Fernandes (2009), 8 pacientes com EM foram entrevistados, e a partir destas
entrevistas sete temas centrais foram construídos, a fim de apresentarem os
sentidos e significados atribuídos ao sofrimento com a EM por estes pacientes.
Foram eles: “Sofrimento Físico”, “Sofrimento Psicológico”, “Sofrimento
Sócio-relacional”, “Sofrimento Existencial”, “Experiências Positivas de
Sofrimento”, “Estratégias de Adaptação” e “Expectativas Futuras”.
Os sofrimentos
físicos (dor, desconforto, sensação de falta de vigor) atrelados às incertezas
do diagnóstico e possíveis limitações de convivência, ou à exposição ao olhar
do outro em momentos de cansaço, por exemplo, predispuseram, segundo os
relatos, aos sofrimentos psicológicos e sócio-relacionais. Nestes últimos
sofrimentos, pode haver a dificuldade do paciente em se reconhecer
identitariamente, por exemplo porque as sensações físicas parecem limitar,
segundo a visão das pessoas com EM entrevistadas, o fazer e o ser por inteiro.
Apesar das
sensações de sofrimento, o autor apontou que as pessoas têm em si o potencial
de contornar tais sofrimentos. As “Estratégias de adaptação” e as “Expectativas
Futuras” apresentam justamente formas encontradas ou percebidas pelos
entrevistados enquanto eficientes para sentirem-se encorajados a viverem com a
EM. Entre estas estratégias e expectativas, os entrevistados citaram: viver um
dia de cada vez; ser perseverante; ajudar a outras pessoas que apresentam a EM
também; procurar distrações e atividades prazerosas; perceber-se em uma rede de
apoio; ter uma experiência positiva do sofrimento, revalorizando a vida e seus
momentos de felicidade (mesmo que aparentemente pequenos) e, por fim,
decidir finalizar projetos.
Escolhi a figura
deste post, pois ela parece mostrar a pluralidade de olhares que cada ser
humano tem, os quais construímos e utilizamos conforme o contexto e as relações
em que estamos. Todos os olhares que você constrói e direciona para a EM são
importantes na construção do tratamento.
É necessário
enfatizar a importância do compartilhamento de saberes entre profissionais e
pacientes, e pacientes entre pacientes, a fim da construção eficaz do tratamento
da EM. Não se trata de você ir ao profissional da saúde, trata-se de você
construir seu tratamento com o profissional da saúde. O que você sofre e o que
você vive em felicidade são as bases do tratamento e da construção da sua
qualidade de vida.
Fernanda Sabatini
Nutricionista
Mestre em Ciência pela Universidade
de São Paulo-USP
Referências
Fernandes RD. Vivências de pessoas
com esclerose múltipla [Dissertação]. Coimbra:Universidade de Coimbra. 2009.
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