quarta-feira, 30 de novembro de 2016

O diagnóstico



Fonte: http://doutissima.com.br/2014/07/06/conheca-os-efeitos-da-esclerose-multipla-e-como-conviver-com-doenca-548232/

 
Meus gritos de desespero ecoavam nos corredores daquela ala do hospital onde eu estava, meu coração se dilacerou e ficou em farrapos. Uma das piores notícias de minha vida, só perdeu pra notícia que recebi quando meu pai estava com câncer alguns anos depois deste episódio. Eu não via nada nem ninguém ao meu redor, somente o medo. Meus cinco segundos de desespero foram importantes pra mim, pensava nas minhas filhas, gritei de raiva, gritei com toda minha força, minha garganta tremia com a vibração das minhas cordas vocais.

Ouço meus gritos e uivos até hoje, se eu fechar os olhos ainda consigo sentir a mesma sensação. O médico disse: ”Esclesore Mútipla”. E mesmo sem saber ao certo o que era, eu sabia que nada de bom poderia ser, pois eu não sentia nada no meu corpo do pescoço pra baixo, já não me levantava, minhas pernas se mexiam com muita dificuldade.

Eu só conseguia pensar em minhas filhas, com a mente atordoada eu ainda me lembrava do “din din din don don don” da ressonância magnética e o meu grito de “nããããooooo” zumbia ainda em meus ouvidos. Meu pai e minha mãe entraram em choque. Após o desespero, que durou sinceramente alguns segundos, veio o silêncio, tenebroso silêncio que dava para ouvir ainda o eco que meu grito causara naqueles corredores frios.

Estávamos todos assustados, os olhares se cruzavam e meu médico acabou com o silêncio explicando sobre essa doença que nunca ouvimos falar.

Não estava sendo fácil, aliás até algum tempo atrás não era, muitas pessoas acreditam que esclerose múltipla tem a ver com gente “doida”. Queria traçar um caminho de volta, mas era ineficiente minha tentativa.

Foi no silêncio da minha ignorância que eu me acalmei.

Já naquela altura, toda minha família e amigos estavam apavorados, cada visita que eu recebia parecia que a pessoa entrava no quarto com um ponto de interrogação gigante ao passar pela porta. Não consigo me lembrar corretamente, porque minha dor de cabeça era muito forte, mas uma visita me marcou, pois com ela eu pude perceber que não seria tão fácil emocionalmente passar por aquilo tudo.

Quando uma prima entrou no quarto, ela começou a me perguntar como eu estava, o que tinha acontecido e imediatamente ao dizer que eu não sentia as minhas pernas, ela passou a mão na minha sola do pé, como se estivesse querendo fazer cócegas, eu estava vendo o que ela fazia, mas nenhuma sensibilidade se mostrou naquele momento, ela então se assustou ao ver que não esbocei nenhuma reação, já que eu morro de cócegas nos pés.

Fiquei pensando, realmente muito esquisito você ver uma parte de seu corpo ali sem reação a qualquer estímulo.

Quanto medo, mas eu tentava não demonstrar. Uma coisa que me deixou mais calma foi a confiança que adquiri em meu médico, eu simplesmente sentia que ele estava certo de que eu poderia confiar. Não tem uma regra certa para que possamos descobrir o melhor médico, a melhor saída ou o caminho a seguir, creio que seja necessário apenas fechar os olhos e sentir.

Depois de tudo isso, foi preciso passar por uma reforma íntima, me abri ao profundo sofrimento para que o sorriso pudesse me contagiar.

Tive que passar por uma reforma interior, olhar cada detalhe, velho ou novo e tudo isso passar por um critério de avaliação para saber o que fica, o que pode ser mudado e o que sai, mas sair mesmo, em definitivo.

Aquilo tudo passou, portanto... fora.

Sei que alguns de vocês se identificaram com este relato, claro que ele é apenas a ponta de um grande iceberg, mas o importante é que estou aqui hoje, em meio às minhas escleroses, vivendo da melhor maneira que posso. Uma das coisas que me ajudaram muito foi me manter em equilíbrio na “síndrome de Poliana”, sabia que tinha pessoas piores que eu, mas tinham melhores também e foi exatamente isso que busquei, estar melhor cada dia. Não estou falando de físico, mas sim do mental, espiritual, cuidando daquilo que comanda nosso corpo muito mais do que imaginamos: o cérebro.

Vivo na roda-viva de emoções e turbulências, de altos e baixos e de alegrias e tristezas, em reforma íntima constante e, cada reforma que passo, é como se eu pudesse recarregar minhas baterias até a próxima etapa. Talvez seja por isso que vivo aprendendo, talvez seja por isso que consigo entender um irmão, talvez seja por isso que tenho tantas histórias pra contar, pois vivo plenamente a minha roda-viva, da maneira mais intensa que eu consigo viver, pois sou apenas mais uma em meio à multidão.

Já fez sua reforma íntima? Você pode mais, muito mais que imagina.

Paz e bem!



Máyra Macedo




Máyra Macedo, 40 anos. Mãe de 3 filhas, Giulia, Gabriela e Pietra com 17, 15 e 10 anos respectivamente. Formada em Logistica, Pós-graduada em Gestão de Açúcar e álcool pela UFSCar. Youtuber do canal Faça Quase Tudo . Apresentadora de TV na TV Cultura Paulista (Quadro Faça Quase Tudo, no programa Universo Mais). Figurinista dos espetáculos Quebra-Nozes e Frozen da escola de ballet Renata Canova. Decoradora e personal organizer.



2 comentários:

  1. Que texto maravilhoso ! Você é muito bonita !

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  2. Não sei se foi nessa época que te conheci Mayra mas me lembro que você estava muito assustada, só espero do fundo do meu coração que eu tenha ajudado a manter a mente quieta e não se desesperar. Mas sei que esse processo é longo e que temos altos e baixos durante toda a vida !!!
    Parabéns por seu trabalho, estou amando !!!
    Bjs
    Fabi

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